CRM porque te quero tanto?


Imagem original (c) "The New York Group"
 

Por: Joaquim Hortinha 
in Jornal de Negócios
2003-02-13


No artigo CRM para que quero?, publicado no Jornal de Negócios em 9 de Janeiro de 2003, foi abordado o tema do CRM sob o ponto de vista de quem o vende e de quem o compra. Deixou-se no ar a interrogação sobre a necessidade ou não de as empresas aderirem a um sistema de CRM. Neste artigo pretende-se desmistificar um pouco mais este assunto, através da identificação de um conjunto de abordagens possíveis e de um conjunto de linhas condutoras, para apoio às empresas que decidirem avançar com a implementação de um programa de CRM.

 

Diferentes abordagens

Um estudo recentemente realizado pelo professor George Day da Universidade de Wharton, junto de 342 Gestores de grandes e médias empresas de sectores tão diferentes como, as utilities, os transportes, o retalho, o sector financeiro e o imobiliário, permitiu identificar três abordagens do CRM[1].

1ª Orientação para o mercado. Nesta abordagem o CRM é um elemento fundamental de uma estratégia focada na entrega de elevado valor ao cliente. Esta estratégia assenta em elementos como um serviço de excepção e um esforço contínuo para satisfazer todas as necessidades e desejos do cliente;

 

2ª Foco na comunicação interna. Nesta abordagem são desenvolvidas acções com vista a uma melhor organização interna da informação, de forma a reduzir o custo dos serviços, ajudar as equipas de vendas a conseguir fechar negócios mais rápido e desenvolver acções de marketing mais adequadas ao target. Esta é talvez a abordagem que dá origem a um maior número de implementações de CRM. No estudo referido, em 20% dos casos, a implementação de programas de CRM veio piorar a comunicação interna. Isto pode acontecer, por exemplo, no caso em que tenho uma aplicação de gestão do serviço a clientes, que tem vindo a conhecer sucessivos upgrades nos últimos anos e que todos os funcionários conhecem. Uma migração para um sistema de CRM sofisticado, difícil de instalar, com alguns ‘bugs’ e para o qual os funcionários da empresa ainda não tiveram formação, então certamente os níveis de qualidade de serviço irão baixar. Segundo o mesmo estudo, é bastante elevado o número de casos de insatisfação de empresas que implementaram o CRM tendo como foco a comunicação interna, o que se pode justificar pelo facto de esta abordagem ter como principal motivação a resolução dos problemas da empresa e não dos problemas dos clientes.

 

3ª Foco em acções defensivas. Tem por base o recurso a acções como sejam, programas de fidelização baseados na redenção de pontos em programas de passageiro frequente. A actividade de CRM de 18% dos inquiridos no estudo tem por base esta orientação. Nestas empresas toda a gente, desde a área financeira até à área de marketing, está preocupada com o cliente e faz deste a sua prioridade.

 

Integrar é vencer

O sucesso da implementação de um programa de CRM nunca será possível se este for limitado apenas a algumas áreas da empresa. Para um desempenho de elevada qualidade, um programa de CRM deverá integrar três componentes:

1ª Uma orientação para a organização, que faça da retenção do cliente uma prioridade e que dê aos empregados liberdade de acção para conseguir a sua satisfação;

 

2ª Informação sobre os relacionamentos, incluindo dados relevantes sobre o cliente e os Sistemas de Informação necessários à sua partilha dentro da organização;

 

3ª Configurar a organização no sentido da construção de um relacionamento com o cliente, o que pode ser conseguido através de incentivos, indicadores e estruturação adequada. Por exemplo, relativamente poucas empresas colocavam a satisfação do cliente e a sua retenção, como factores a ter em conta na avaliação de performance dos seus Recursos Humanos. Metade delas nem sequer lhes fazia referência. Contudo, por exemplo, a Siebel (www.siebel.com) é obsessivamente focada na satisfação do cliente, fazendo depender desta, em 50%, o incentivo dos ‘top managers’ e em 25% o dos vendedores.

 

Organizar para ter sucesso

As abordagens tradicionais à questão do CRM têm vindo em parte a demonstrar alguma ineficácia, traduzida na insatisfação de um número significativo de empresas que adquiriram programas deste tipo. De modo a retomarem esses programas ou a iniciar novos, as empresas podem basear-se em três princípios base:

1º Utilizar a experiência do cliente como base da criação de valor para a marca, recorrendo, não só às habituais ferramentas de comunicação de massas, como também e sobretudo a uma politica de satisfação total na interacção do cliente com a empresa e com os seus produtos e serviços através dos diferentes canais de distribuição;

 

2º Tornar o contributo do cliente na base do seu tratamento, em que cada contacto, que este tem com a empresa, deve contribuir para aumentar a sua satisfação;

 

3º Planear o CRM de forma pragmática, tendo em conta os aspectos financeiros e o risco de entrega. Deve evitar-se que o CRM seja um Roll-Royce e faça incorrer a empresa em custos demasiado elevados em termos de processo de gestão de clientes.

 

Estes três princípios base permitem identificar um conjunto de passos a seguir no planeamento e construção de um processo de CRM:

 

1º Definir a estratégia. Os investimentos em CRM devem ter origem numa perspectiva estratégica e não na necessidade de aquisição de uma nova ferramenta informática de gestão de clientes. Esta estratégia permitirá identificar as necessidades reais em termos de CRM, reduzindo os custos;

 

2º Recolher informação sobre o cliente. Este aspecto é fundamental para compreender as necessidades do cliente e prever o seu comportamento futuro. Da análise da informação recolhida resultará a definição da forma como a empresa irá interagir com o cliente no futuro, por exemplo em termos da construção do marketing-mix;

 

3º Retirar valor de cada contacto dos clientes, através da máxima satisfação em todas as interacções com a empresa;

 

4º Criar uma maior interligação entre CRM e marketing. Enquanto no passado o foco do CRM estava na venda e no serviço, remetendo para segundo plano os aspectos de marketing, numa nova filosofia, estes têm um papel preponderante, permitindo o fecho do ciclo em termos de informação sobre o cliente, bem como uma melhor organização da função de marketing.

 

Em resumo, é preciso desmistificar afirmações como ‘O CRM é muito caro’, ‘O CRM é só para as grandes empresas’ ou ‘O CRM é muito difícil de implementar’. Cada empresa é um caso diferente e se começarmos por respeitar os princípios base e os passos apontados, pode implementar-se um programa de CRM de sucesso, sem correr o risco de estar a criar um ‘elefante branco’ na empresa.

Joaquim Hortinha
Professor Universitário
Autor do livro X-Marketing 


Resumo Curricular do Autor


Joaquim Hortinha, Setembro de 2000

Licenciado em Engenharia Electrotécnica e Computadores pelo IST (Instituto Superior Técnico), MBA pelo ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa), Mestre em Ciências Empresariais pelo ISCTE e doutorando em Gestão pela Universidade de Évora. Actualmente é Professor do ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão), onde assegura a docência da disciplina de e-Marketing nos Cursos de Pós-Graduação de Marketing Management e e-Business. Lecciona ainda no PAME -Programa Avançado de Marketing para Executivos da Universidade Católica Portuguesa e no Curso de Pós-Graduação em Enterpreneurship do INDEG/ISCTE. Leccionou no MBA de Marketing do CEDEPE no Recife-Brasil e exerceu ainda actividades de docente e consultor/formador no ISCTE, IPAM (Instituto Português de Administração de Marketing), Universidade Lusófona, Fundetec, Grupo Egor, INETI (Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial), Instituto de Merchandising e Editora McGraw-Hill.

É Director de Gestão de Clientes da Aquapor, empresa do Universo Águas de Portugal. Foi subdirector de Negócios Internet da ONI Telecom, com a responsabilidade pelo Marketing e Vendas, Marketing Manager do portal Sapo e Director Adjunto de Marketing da TV Cabo Portugal. No seu percurso profissional são ainda de referir a Schneider Electric Portugal, como Marketing Manager e Key Account e a Brisa-AutoEstradas de Portugal, como Coordenador de Projectos.

Contacto:
Joaquim Hortinha 
webmaster@e-marketinglab.com

 


[ << Regressar à Página Inicial ]